5 de outubro de 2016


Outubro Rosa

Em meados de 2003, aos 17 anos, dentro de um consultório médico.

     - Você tem câncer de mama!
     - Doutor, eu tenho chances de cura?
     - Você acertou na loteria de traz pra frente, agora é se tratar.

Sai daquela sala consternada e com lágrimas nos olhos.
Atravessei a Avenida 9 de Julho sem olhar para os lados, sem ninguém do meu lado pra me dar a mão, pra me amparar.
Pensamentos borbulhavam na minha cabeça e eu só queria achar novamente o chão que acabara de perder.

E foi ali que eu acordei para uma nova vida, uma nova experiência que nunca passou pela minha cabeça vivenciar.
Naquela noite minha casa se encheu de gente, pessoas que eu não via há algum tempo foram pessoalmente pra me acalmar, e eu tampouco entendia tudo aquilo, na verdade eu só queria chorar sozinha, e assim o fiz por vários dias.

Alguns meses depois do choque entrei na sala de cirurgia, naquele momento eu não sabia se sairia mutilada parcial ou totalmente e após o término daquilo tudo terminei feliz, foi me tirado apenas ¼ da mama esquerda.

Foram 2 cirurgias, 12 sessões de radioterapia, 8 sessões de quimioterapia, 12 injeções hormonais na barriga e 5 anos de tratamento com um remédio que me fez conhecer os sintomas da menopausa com apenas 18 anos, sim, eu tive menopausa antecipada e senti todos os sintomas, como:  calores, calafrios, falta de libido, alteração de humor, entre outros...

Foi justamente nessa fase que eu, ciente do comportamento que meu corpo apresentava, em uma consulta de rotina, perguntei de forma calma ao meu médico:
     - Doutor, no futuro, após tudo isso passar, poderei ter um filho?
Obviamente aquela era somente uma questão que estava sem resposta na minha cabeça, eu precisava perguntar por que tinha um relacionamento sério com um namorado de adolescência, e queria saber a verdade, mas a resposta veio de forma dolorosa:

     - Se preserve daqui a alguns anos você até poderá engravidar, mas pense nessa criança, você vai querer ter um filho e deixa-lo aqui sozinho, pro mundo criar? Não né? Então se eu fosse você descartava essa opção.

Mais uma vez eu saia arrasada de um consultório médico, na primeira vez com o diagnóstico, e da segunda, colocou-se em cheque o meu maior sonho da vida, ser mãe.

Durante os meus tratamentos, encontrei histórias e histórias, pessoas e soldados, encontrei médicos que me devolveram o ar, encontrei céticos que me tiraram o sono encontrei os que não acreditavam, e os que tinham fé, os que superaram e os que partiram, os que me injetaram medo e os que me devolveram a esperança...

Após todo o tratamento, ainda convivi alguns anos com a menopausa antecipada e aos poucos tudo foi se normalizando.
Foi em 2013, que o inesperado aconteceu, após sentir um mal estar e ir ao médico recebi outro diagnóstico, dessa vez de VIDA, eu estava grávida.

O Nickolas embora não tenha sido programado, foi muito esperado e amado, seu nome tem origem grega (níke significa “vitória”, e laos significa “povo”),  do qual resulta " povo vitorioso ou vitória do povo”.
Foi uma gestação tranquila, gostosa e eu não consegui amamentá-lo com os dois seios, eu até tentei, mas o seio operado só possuía metade do bico e isso não foi suficiente para satisfazer o mocinho. Com garra e muita persistência, consegui amamentar com um seio só até ele completar  9 meses, e essa é de fato uma das coisas que mais me orgulho em contar nessa vida.
Hoje, meu vitorioso tem 3 anos e meio, é minha maior prova de que tudo depende de nosso comportamento perante as previsões negativas e as dificuldades.
Meu amor de adolescência e eu completamos 15 anos de parceria agora em 2016, e a ele devo minha gratidão, foi na mão dele, na da minha mãe e na da minha sogra linda que eu apertei quando não enxerguei nada adiante ou quando pensei que fosse cair.

Acho que 70% de meus amigos não sabem que tive CA, nunca escrevi sobre e sempre pensei 2 vezes antes de contar. Sempre tive medo/vergonha de qualquer rótulo de vítima, porém,  nas ocasiões em que julguei  necessário levar  essa história somando positivamente a alguém, eu o fiz sempre do meu  jeito, de forma tranquila, sem alvoroço.

Muitas vezes já escutei o termo “guerreira”, sinceramente me deixa sem graça, não consigo me encaixar nesse título, pois apenas briguei por algo que não queria perder, que de direito era minha.
Sinto-me vitoriosa, é diferente, me sinto forte por ter dado uma rasteira nas estatísticas, digo isso porque eu sempre fui a paciente mais nova de todos os meus médicos, e até hoje, a cada exame de rotina ainda me deparo com profissionais muito surpresos com minha história de CA de mama na adolescência.
Sinto-me vitoriosa por ter amamentado (quem diria?), por ter um filho maravilhoso (que é a criança mais carinhosa que já conheci), me sinto a mulher mais feliz do mundo por ter apenas 32 anos e uma história de amor de 15, em um mundo onde tudo se tornou tão banal, inclusive relações.
Essas coisas sim me enchem de orgulho.
Orgulho-me por ter poucos e BONS amigos.
Orgulho-me por ter uma pequena GRANDE família.
E sou grata por cada dia que amanhece e feliz por tudo o que eu conquistei, não peço nadinha a Deus, não tenho nem coragem, só agradeço e agradeço, claro que se ele quiser desenhar ainda mais a minha história da forma linda com que fez, fica a cargo dEle, mas não peço, só devolvo-lhe minha gratidão eterna.


Bem vindo, Outubro.

A mochila

14:15 - 29/9/16
Sentada no ônibus, voltando de um médico no Centro de SP e retornando ao trabalho, observo um garotinho de uns 10 anos.
Sentada a sua frente, uma mulher aparentando seus 40 e poucos.
Naturalmente inicia-se uma conversa:
- Oi tudo bem, estava te observando ler, qual seu nome?
- Meu nome é Matheus, estou estudando pra prova de amanhã.
- Legal, e você está voltando da escola?
- Sim, eu moro no Campo Limpo mas estudo no centro, de manhã venho com minha mãe, e na volta vou sozinho pra casa.
- Nossa tão novinho e ja se vira tão bem, que horas você sai de casa todo dia.
- Ah saio bem cedo, acordo as 4 da manhã pois a aula é as 7.
- Mas porque estuda tão longe de casa?
- Ah porque a escola próxima de casa não é tão boa, mas essa minha mãe contou que é melhor e por isso venho com ela todo dia, mas como ela trabalha até as 17h, eu volto sozinho.
- Meu Deus, você salvou meu dia, justamente hoje eu acordei resmungando porque levantei as 7, que esforçado é você Matheus. Agora é chegar em casa e dormir né??
- Não, agora eu vou pra casa almoçar e depois vou praticar esporte.
- Que legal, que esporte você faz?
- Eu faço basquete, vôlei e tênis no Céu Campo Limpo, só não gosto muito de futebol.
- Nossa, que fôlego, se fosse eu estaria é cochilando aqui nesse ônibus, nem sei se conseguiria estudar, você tem irmãos Matheus?
- Tenho 2 por parte de pai e mais "x" da minha mãe.
- E me diga uma coisa, o que você vai ser quando crescer?
- Eu quero ser dublador de voz, mas preciso estudar muito né...
- Você está no caminho certo, sabe Matheus, estava pensando aqui e eu vou te dar uma coisa que comprei pra mim, mas acho que será muito mais útil pra você, e quero te dizer que adorei te conhecer, tenho só um pedido: continue sempre no caminho do estudo e do bem, porque quem sai desse caminho, só se da mal na vida.
Essa MOCHILA é pra você carregar suas coisas na maratona diária que você enfrenta, como já disse, foi Deus que me fez te encontrar hoje....
Matheus que eu nem sei se é com "th" mesmo, naquele momento abriu um sorrisão (aposto que era o seu melhor sorriso😆), ele agradeceu repetidas vezes e ficou fitando a "amiga de prosa" um tanto tímido, sem ação.
Nesse momento, eu reparei no quanto a mochila dele estava desgastada, carregando as marcas do tempo, quem sabe de 1, 2 ou mais anos de estudo. Ele pegou sua velha de guerra e imediatamente abriu a que ganhou de presente e a colocou dentro, sim a mochila nova era tão grande que suportou outra mochila dentro. Fora que era toda equipada, tinha até uma capa para tablet de brinde. Matheus ficou tooodo satisfeito.
Ali ela começou a se despedir, ainda lhe deu mais alguns conselhos antes e rapidamente desceu, não tive a oportunidade de agradecê-la por também ter mudado o meu dia (até porque naquele momento eu devia estar com a cara do Deby ( do Debby & Loide)...
Algumas pessoas que ali estavam, também esboçavam sorrisinhos de canto de boca.
Eu ensaiei uma frase pra dizer a ela mas não tive tempo, ou talvez coragem, então, aqui deixo pública minha gratidão a esse exemplo de pessoa e a esse exemplo de criança. Pessoas assim me fazem enxergar só perspectivas boas pra esse mundão que por muitas vezes já julguei perdido.
Eu discretamente registrei essa troca que só me acrescentou.
Obrigada moça do 5119, obrigada!
E Matheus, vai firme no seu sonho moleque, que eu ainda quero assistir um filme dublado por você.

29 de julho de 2016

Eu não vou comer a tortuguita porque eu gosto dela

Na noite passada eu prometi ao Nickolas que traria um chocolate do trabalho pra ele, caso ele não fizesse xixi na fralda. 
Ele dormiu uma noite tranquila e acordou sequinho, eu dei os parabéns e ele me questionou se ganharia um chocolate, como prometido, eu disse que sim.
Ao chegar do trabalho, foi a primeira coisa que ele me cobrou. 
Eis que eu aleatóriamente comprei uma tortuguita, mas, ele deu as duas primeiras mordidinhas e só percebeu que o formato do chocolate era de tartaruga quando o retirou totalmente da embalagem.
Após isso, veio uma reação inesperada que me inspira a postar, divulgar e morrer de amor por esse 'serumaninho' maravilhoso em construção.
 Meu bem, você é lindo até comovido, chorando, ao avesso. Te amo por isso e muito mais.

https://www.youtube.com/watch?v=YUMvuFcsN2o